*José do Vale Pinheiro Feitosa
Pensadores da Escola Nacional de Saúde Pública e o Ministro José Gomes Temporão deram-me um nó amplo. Comprometeram- me o pensamento, a iniciativa e o verbo. Tudo devido as Fundações Estatais e ao respeito, quase doutrinário, que tenho pela instituição e pelo Ministro.Hoje mesmo um funcionário público (sem mais nenhuma convicção de Servidor Público), na página de opinião de o Globo, usando o ministro Temporão como escada, desanca a carreira pública para médico.
Desanca o Regime Jurídico Único, sua estabilidade no emprego e na renda pós-aposentadoria. Jerson Kelman, do alto de sua cadeira de Diretor da ANEEL, frente a um oceano de oportunidades no futuro não muito remoto, usa os retalhos do pensamento para construir uma estátua de sucata em metais. Existe tanta relação entre estabilidade e acomodação, quanto entre guerra e prosperidade. Existe tanto amor entre predadores, quanto a insustentável leveza da renda de Servidores Públicos após sua aposentadoria.
Isso é o que o pensador Português, Boaventura Sousa Santos diz em recente artigo para o site Carta Maior: "*Vivemos um tempo em que a estabilidade da economia só é possível à custa da instabilidade dos trabalhadores, em que a sustentabilidade das políticas sociais exige a vulnerabilidade crescente dos cidadãos em caso de acidente, doença ou desemprego." *
Deixe-me aclarar as posições históricas e compreendam- me, mesmo que em seus lábios surjam uns risos sardônicos que merecem os dinossauros de uma sociedade justa. Quando estudava medicina, freqüentava uma cadeira de Clínica de Doenças Infecciosas e Parasitárias (medicina da saúde pública), militava e fui trabalhar naquilo que acreditava. E é verdade, acredito e luto, e milito por um futuro melhor. Por um mundo que não é igual ao que é hoje, mas dele deverá emergir. Não procuro o céu, apenas busco a terra onde vivo.
Quando me associei ao chamado Partido Sanitário, ao pensamento socialista e à luta trabalhista, o fiz porque acreditava que a raiz dos problemas de saúde estava no modo como a sociedade brasileira produzia, distribuía e consumia suas riquezas. Quando hoje me mantenho na mesma trilha, é que a vida e a experiência acumulada, os retalhos e sucatas do dia-a-dia, este amontoado de lixo ideológico e medidas da moda e de referências internacionais, não me deram catarata na visão. Sei o quanto a realidade hodierna é um fabuloso universo em vias de um empurrão para se esfumaçar.
A realidade não é sólida, ela está preste a "se desmanchar no ar". Vou fazer o meu papel e logo garanto, não sou apenas um, somos tantos. E tantos que atéme importa a rima do Vinicius de Moraes: tantos, Maestro Moacir Santos. E no embalo: geógrafo Milton Santos. Acrescento ao que acreditava então e hoje acredito ainda mais. O papel do médico numa sociedade justa, em que a própria capacidade de prevenir e recuperar-se de doenças seja um norte civilizatório, não pode e nunca poderá ser objeto de mero jogo exploratório de mercado.
A medicina resumida a mero consumo e a valores do jogo de mercado, com suas fantasias e fetiches, é um anticlímax para a evolução do conhecimento e da própria ciência médica.Na verdade é um futuro que já contamina o centro do capitalismo, o grau de dependência econômica das pessoas aos medicamentos de uso contínuo, as órteses, próteses, cirurgias e outras novidades serão de tal volume que pagar impostos ao estado Burguês será uma obrigatoriedade de faz de conta.
Portanto não acredito que a evolução da Administração do Sistema Único de Saúde será através do médico liberal e nem do sistema privado. Não acredito por uma questão em que a saúde não é meramente assistência médica e o SUS (universalidade, equidade, integralidade) terá uma contradição permanente com o sistema econômico vigente. Neste sentido a simples transferência dos conflitos trabalhistas do ABC paulista para o seio do Servidor Público (Funcionalismo) e da modalidade de relação não ideológica com a saúde e sim com a relação de exploração Estado e Trabalhador, foi um erro central a justificar a raiz desta ampla "privatização" do sistema de saúde.
Claro que não poderemos esquecer a enorme influência que teve nisto tudo a chamada "Saúde Complementar" que venderia leitos ao sistema público e terminou porser 80% dele. Aliás o Partido dos Trabalhadores deve refletir muito sobre o papel deles na saúde pública nacional, ao mesmo tempo fiéis lutadores pelo SUS e naoutra ponta exímios negadores de sua consolidação. Todos sabemos que a evolução dos Planos de Saúde se sustenta, também, pela mentalidade sindical da cidade de São Paulo, cidade que retêm 43% dos beneficiários dos Planos de Saúde. Não nos surpreendamos que um parlamentar ou senador do PT venha a se preocupar como o Estado poderá remunerar planos de saúde para aposentados em detrimento do SUS.
Não nos surpreendamos porque o "objeto de desejo" desta luta sindical não socialista e de resultados (incluindo a Força Sindical em parte albergada no PDT) é a reivindicação de PLANOS DE SAÚDE. E, claro, nesta esteira, de escola privada e previdência privada.Prova.
Vejamos a dificuldade das lideranças do PT e do PDT de fazer frente a modelos que privilegiam as relações mercantis no SUS em detrimento do modelo ideológico e universalista.
O ministro Paulo Bernardes ao comentar a reação de certos segmentos do PT à criação das Fundações, se referiu ao próprio partido como detentor de posições defasadas em dez anos.Imagine o seguinte: um partido que não tenha uma idéia capaz de ultrapassar dez anos deve ser uma "empresa partidária", pois partido pensam cem anos à frente. Pode ser que, por outro lado, o próprio ministro Bernardes seja um "modista" da "reengenharia".
Escola Nacional de Saúde Pública e o Ministro Temporão me deram um nó, pois deles esperaria a ousadia de aprofundar a mudança da sociedade capitalista, que foi criativa em acumular riquezas e a promover ampla exclusão social. A discutir temas como o caso simbólico da indústria farmacêutica, do aborto, da desgraça social da menor grávida, do alcoolismo, da licença maternidade e outros temas que penetram na contradição do capitalismo.
Mas gostaria que não abandonassem a necessidade de manter em hegemonia o pensamento original da Partido Sanitário e isso se dará com o debate sincero da produtividade em termos da melhoria da sociedade e não damelhor acumulação de numerários; ocorrerá se somarmos continuamente Servidores Públicos, treinando-os, refletindo a realidade indutora de doenças, refletindo a exploração econômica da prevenção de doenças e recuperação da saúde.
E, principalmente, entendendo a parte que cabe ao Servidor nesta imperfeição, ampla e generalizada, do "mercado de saúde".Enfim, espero que a ESQUERDA na saúde promova uma ampla profissionalização dos gestores hospitalares e de saúde, privilegie a carreira do Servidor Público,reduzindo o perfil de relação de mercado entre os profissionais de saúde e o cidadão. Ou seja, que o norte para ser servidor da saúde seja a relação profissional e o cidadão e não a de médico valorado e o cliente explorado.Ao invés de reduzir a reflexão sobre a realidade sujeita meramente ao mercado, amplie-se a reflexão do sujeito que observa o impacto do mercado sobre a saúde pública e se coloca ideologicamente na perspectiva humanista.
Aliás é preciso entender que a Constituição quando criou o RJU ajustou isso: quem quiser ser funcionário público, terá estabilidade no emprego e na renda, na dignidade, terão obrigações públicas e históricas com a cidadania. Por isso é que os argumentos reacionários atingem justamente essa equação, pois o norte dos neoliberais é o das relações de mercado.
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